O que faz um negócio ser sustentável?
A pergunta não possui resposta fácil e é possível respondê-la a partir de diversos ângulos, como financeiro, social, ambiental e até cultural. O que parece ser um consenso, é a definição de negócio sustentável quando esse gera valor no presente sem comprometer o futuro, passando pelos diversos aspectos que ele pode impactar.
Entendemos, pelos nossos estudos e experiências profissionais, que os resultados não se constroem apenas com boas estratégias ou com metas cascateadas para todas as pessoas da organização. Eles dependem, sobretudo, da forma como as pessoas vivenciam as experiências no dia-a-dia das organizações para entregar os resultados. A partir disso, conceitos como cultura, saúde e sustentabilidade do negócio não são consideradas dimensões separadas, mas fenômenos que, quando bem alinhados dentro da estratégia da empresa, dão realidade à jornada intencional da pessoa colaboradora. A cultura mostra como as coisas são feitas naquele grupo; a saúde, no sentido amplo de bem-estar físico, mental e social, permite a energia necessária para o engajamento e o desempenho; e a sustentabilidade do negócio emerge quando esses elementos se conectam de forma coerente, criando um ciclo positivo entre pessoas com saúde, engajadas e resultados consistentes.
Dessa forma, quando nos perguntamos o que faz um negócio ser sustentável, percebemos que a resposta não está apenas em indicadores financeiros ou ambientais, mas também na maneira como a jornada da pessoa colaboradora é vivida no dia a dia. É nesse caminho que cultura, saúde e engajamento se entrelaçam e dão sentido à prosperidade organizacional. Colocar a experiência das pessoas no centro é o que garante que os resultados de hoje não comprometam o futuro, mas o fortaleçam. Nesse contexto, a proposta de valor para a pessoa candidata e colaboradora (EVP – Employee Value Proposition)¹ deixa de ser apenas uma promessa no papel e passa a ser o fio condutor que traduz a identidade da empresa em experiências concretas em cada ponto da sua jornada, do recrutamento à permanência saudável na organização.
A partir dessas conexões, vamos explorar esses temas e apresentar caminhos para transformar teoria em prática, com as pessoas colaboradoras no centro, passando por cultura, saúde, prosperidade organizacional e EVP. Nosso artigo tem como base principal a literatura de Richard Barrett, por entendermos ser ele um dos principais teóricos que tratam de forma profunda e atual as temáticas da prosperidade e sustentabilidade organizacional.
Ambiente de trabalho mais humano: por que isso importa?
Empresas que colocam a jornada do colaborador no centro tendem a apresentar maior engajamento, menor rotatividade (turnover) e melhores índices de desempenho. Contudo, dados recentes indicam que esse ainda não é o cenário predominante. Em 2024, o percentual global de trabalhadores engajados caiu de 23% para 21%, resultado especialmente impactado pela queda no engajamento de gestores — jovens, com menos de 35 anos, e mulheres, que apresentaram reduções de cinco e sete pontos percentuais, respectivamente (GALLUP, 2025). Esse quadro evidencia que, sem práticas consistentes de valorização da experiência do colaborador, a motivação e a produtividade ficam comprometidas. Hoje, “o mundo profissional está abarrotado de sistemas, processos, ferramentas e pressupostos profundamente falhos que obstruem nossa capacidade de expressar, no trabalho que realizamos todos os dias, o que temos de único” (BUCKINGHAM; GOODALL, 2019, posição 94). Na prática, isso significa que continuamos reproduzindo modelos de gestão e processos que, embora sofisticados, deixam de considerar o todo e passam a atuar de maneira fragmentada, sem conexão real com a complexidade das necessidades do trabalho contemporâneo.
Hoje sabe-se que o bem-estar dos trabalhadores se relaciona diretamente à sustentabilidade financeira das organizações. De acordo com a Gallup (2025), 75% dos custos médicos estão associados a condições preveníveis. Ainda, para cada 10.000 trabalhadores, funcionários em situação de sofrimento ou baixa vitalidade representam aproximadamente 20 milhões de dólares em perdas de oportunidade. Globalmente, estima-se que o burnout seja responsável por 322 bilhões de dólares em custos de rotatividade e perda de produtividade. Em termos percentuais, entre 15% e 20% da folha de pagamento anual das empresas é consumida apenas por turnover voluntário associado ao esgotamento profissional. Essa evidência não se limita a custos evitados. Pesquisas recentes demonstram que empresas com altos índices de bem-estar também superam financeiramente seus pares de mercado.
O Wellbeing Research Centre da Universidade de Oxford, em parceria com Harvard University, analisou mais de 1.600 empresas e 15 milhões de respostas de colaboradores, mostrando que as organizações com maior bem-estar obtiveram 20% de retorno superior em comparação ao S&P 500 e ao Dow Jones no mesmo período de retorno superior em comparação ao S&P 500 e ao Dow Jones no mesmo período (WELLBEING RESEARCH CENTRE, 2023). Portanto, investir em ambientes de trabalho saudáveis e em uma jornada centrada no colaborador deve ser considerado um fator estratégico de impacto direto na performance e na sustentabilidade organizacional. Ambientes tóxicos, ao contrário, tendem a aumentar o absenteísmo, os afastamentos e os custos de saúde ocupacional, comprometendo não apenas os resultados financeiros, mas também a própria viabilidade de um modelo de gestão humanamente sustentável.
Todos esses dados dizem o quanto o sucesso do negócio só se faz sustentável quando também considera negócios humanamente sustentáveis, como diz Renata Rivetti em seu livro “O poder do bem-estar”. Segundo ela, construir possibilidades para a cultura do bem-estar, cuidar do tempo, do próprio trabalho e das relações que são estabelecidas no contexto laboral são caminhos que podem afetar positivamente o entorno, incluindo as pessoas e o próprio negócio. Afinal, as empresas fazem parte da sociedade e do país e não devem ficar de fora desse cenário.
Nas organizações, a área de Recursos Humanos costuma se estruturar em subsistemas (como por exemplo: Recrutamento e Seleção, Gestão de Desempenho, e Remuneração e Benefícios) com processos, papéis e responsabilidades definidos, considerando cargos e metas de entrega. No entanto, esse desenho tradicional nem sempre é capaz de responder aos obstáculos reais que as empresas enfrentam atualmente. Os desafios contemporâneos em gestão de pessoas não têm respostas em “caixinhas” pré-definidas, com subsistemas e fluxos desenhados. É preciso pensar na amplitude dos conceitos, colocando as pessoas colaboradoras no centro das decisões, já que é por meio delas que as empresas prosperam.
Neste artigo, vamos além das respostas tradicionais do RH, que costumam se concentrar em produtos e entregáveis específicos, como contratar uma pessoa ou definir o modelo de avaliação de desempenho da organização. Nossa proposta é trazer reflexões que se conectam à jornada completa do colaborador — desde os primeiros contatos antes da sua entrada na organização até o desligamento — e também à forma como a empresa estrutura sua estratégia. Assim, os subsistemas de RH, como recrutamento, desempenho, remuneração e engajamento, deixam de funcionar como “caixinhas” isoladas e passam a se integrar de forma coesa, evitando divergências ou perspectivas antagônicas que não se conversem. Os conceitos que apresentaremos a seguir oferecem sustentação teórica e prática a essa proposta, dialogando com os estágios de desenvolvimento descritos por Richard Barrett, que serão detalhados ao longo do texto.
Cultura, valores e prosperidade organizacional
“Cultura representa os padrões de comportamento que são encorajados, desencorajados ou tolerados ao longo do tempo. É o que é criado a partir das mensagens recebidas sobre como se espera que as pessoas se comportem.” (TAYLOR, 2015, p. 5, tradução nossa). Esse fenômeno dificilmente se traduz apenas nos slogans institucionais, na decoração do ambiente ou em indicadores apresentados em reuniões semestrais. A sua verdadeira expressão aparece no cotidiano: na forma como as reuniões são conduzidas, na maneira como as pessoas se tratam, nos critérios de promoção, na gestão de conflitos, nas práticas de reconhecimento e até na vivência de jogos políticos internos.
Segundo Buckingham e Goodall (2019), a cultura tem relevância porque contribui para explicar três pontos:
- Quem é você no trabalho;
- O sucesso do negócio;
- E o rumo que a empresa quer dar, pela “cultura do desempenho”, “cultura do feedback” ou “cultura da inovação”, por exemplo.
A compreensão da cultura organizacional exige olhar para diferentes níveis de profundidade. Conforme Schein (1992), ela pode ser observada em três dimensões interdependentes: os artefatos, que representam os aspectos visíveis do ambiente, como símbolos, linguagem, estruturas e rituais; os valores, que refletem crenças conscientes e que orientam escolhas e comportamentos; e, em um nível mais profundo, os pressupostos básicos, que são crenças inconscientes assumidas como verdades e que moldam a forma como os membros da organização percebem e interpretam a realidade. A análise integrada desses elementos possibilita identificar não apenas a face aparente da cultura, mas também os padrões invisíveis que sustentam práticas e decisões no cotidiano organizacional.
Se para Schein (1992) os valores se manifestam no nível intermediário entre os artefatos visíveis e os pressupostos básicos invisíveis, Richard Barrett (2015, 2017a) aprofunda essa perspectiva ao demonstrar que os valores funcionam como bússolas internas que orientam tanto indivíduos quanto organizações em suas escolhas cotidianas.
Para Barrett, os valores podem ser compreendidos em diferentes níveis de consciência e desenvolvimento, indo desde necessidades mais básicas, como segurança e estabilidade, até níveis mais elevados, relacionados à transformação, contribuição e serviço ao bem comum.
Esse modelo mostra que a prosperidade de uma organização depende da capacidade de alinhar valores individuais e coletivos. Dessa forma, para nós, os valores ocupam uma posição central dentro da cultura organizacional.
Entendemos que a prosperidade organizacional, é construída a partir de valores, confiança e sustentabilidade da performance, não se restringindo a métricas financeiras. Para Barrett (2017a), a integridade e o foco em construir um futuro sustentável para pessoas colaboradoras, clientes, comunidades e para a sociedade em geral fazem com que a prosperidade se conecte diretamente à qualidade da cultura organizacional e à capacidade de criar valor compartilhado. Dessa forma, a nossa proposta visa à construção de um diagnóstico e um caminho prático para orientar escolhas e decisões sobre quais valores devem ser priorizados nas organizações.
Entre esses valores, destacamos dois essenciais para a promoção da prosperidade organizacional: o foco nas pessoas (human-centric) e o foco no cliente (customer-centric). A real prosperidade só ocorre quando esses dois focos estão conectados, ou seja, quando o cuidado genuíno com as pessoas dentro da organização se traduz também em atenção consistente às necessidades dos clientes. Essa coerência fortalece tanto a vivência interna quanto a experiência externa, criando um círculo virtuoso de sustentabilidade. Isso porque, como diria Barrett (2015), a prosperidade envolve o equilíbrio entre o que existe a nível individual e coletivo, entre o que está dentro e fora do ambiente organizacional.
Assim, valores centrados no ser humano tornam-se a base não apenas para o engajamento e a confiança, mas também para resultados duradouros no mercado. Nós acreditamos que a real prosperidade só ocorre quando existe a conexão entre o “foco genuíno nas pessoas” e o “foco real nas necessidades dos clientes”. Ou seja, essa relação precisa ser forte para estar em peso nas decisões e priorizações das empresas. Essa ligação mostra que cuidar das pessoas funcionárias é o caminho para gerar experiências melhores para quem está fora dela. A cultura organizacional promove a sustentabilidade do negócio quando está ancorada em valores que equilibram bem-estar humano, alinhamento estratégico e orientação ao cliente. É nesse ponto que a cultura deixa de ser apenas discurso e passa a operar como motor de prosperidade e reciprocidade na relação empregado X empregador.
EVP, Saúde cultural e Prosperidade Organizacional
Quando os valores organizacionais estão claros e coerentes, eles promovem confiança, engajamento e inovação — elementos que sustentam o negócio no longo prazo. Por outro lado, quando há divergência entre o que é dito e o que é praticado, surgem desgaste, perda de credibilidade e queda na performance. Essa coerência entre discurso e prática está no cerne da gestão da marca empregadora (employer branding), pois traduz a forma como a organização garante que seus valores sejam de fato vividos no cotidiano. Um dos principais instrumentos para assegurar essa coerência é a construção da proposta de valor para pessoas colaboradoras e candidatas (EVP — Employee Value Proposition). O EVP funciona como um fio condutor, transformando valores em experiências concretas ao longo da jornada do colaborador e permitindo que a empresa alinhe expectativas individuais e coletivas em torno de um mesmo propósito. Assim, a prosperidade organizacional não depende apenas de declarar valores, mas de sustentá-los por meio de práticas consistentes que fortalecem a confiança e o engajamento.
Garantir a coerência dos valores por meio do EVP é uma parte do processo. Para que essa coerência não permaneça apenas no nível do discurso, é necessário medir se, de fato, os colaboradores percebem essa vivência no dia a dia da organização. É justamente nesse ponto que entram os conceitos de saúde Cultural (Cultural Health) e entropia Cultural (Cultural Entropy). Esses indicadores permitem avaliar até que ponto os valores estão sendo traduzidos em experiências reais e consistentes, revelando se a promessa da marca empregadora está sendo cumprida na prática. A saúde cultural é o inverso da Entropia cultural² e mede a proporção de valores positivos em uma empresa, refletindo o quanto os colaboradores percebem que suas necessidades estão sendo atendidas (BARRETT, 2017b). Essa definição evidencia que a entropia cultural corresponde à energia desperdiçada em disfunções, medos e desalinhamentos, enquanto a saúde cultural corresponde ao grau de vitalidade e bem-estar do desenvolvimento organizacional e das pessoas que ali trabalham. E é justamente aqui que o conceito se conecta ao EVP. Se o cultural health revela até que ponto as necessidades dos colaboradores estão sendo atendidas, ele também evidencia se a proposta de valor da marca empregadora está sendo, de fato, vivida na realidade.
Em outras palavras, funciona como um termômetro para saber se existe coerência entre o que a empresa promete na sua proposta de valor e a experiência concreta das pessoas que já fazem parte da organização.
Enquanto a entropia cultural mostra “quanto o copo está vazio”, a saúde cultural mostra “quanto o copo está cheio” (BARRETT, 2017b), ou seja, a energia vital direcionada para o bem-estar e para a sustentabilidade do negócio. Quando o EVP está bem estruturado e gera alinhamento, o cultural health score tende a ser alto — indicando que a empresa está proporcionando condições para permanência, performance e prosperidade. Quando há descompasso, a entropia cultural cresce, mostrando que a promessa feita ao talento no momento da atração não está sendo entregue no cotidiano. Assim, medir e desenvolver o cultural health a partir de um EVP consistente não é apenas uma prática de gestão de pessoas: é um pilar para garantir saúde cultural e prosperidade a curto, médio e longo prazos.

Os sete estágios de desenvolvimento segundo Richard Barrett
Para estruturar, construir e aplicar um EVP real e sustentável, os sete estágios de desenvolvimento são fundamentais para compreender onde o negócio está e o que é possível ser feito e aprimorado. De acordo com Richard Barrett (2017a), tanto indivíduos quanto organizações passam por sete estágios de desenvolvimento, cada um representando necessidades e desafios específicos a serem superados.
Esses estágios formam um modelo evolutivo que mostra como a realização das necessidades mais básicas abre espaço para níveis mais altos de consciência e impacto.
- Sobrevivência – foca na satisfação das necessidades fisiológicas e de segurança. Para organizações, envolve estabilidade financeira e condições básicas de funcionamento.
- Relacionamento – refere-se ao pertencimento, confiança e conexões humanas. Nas organizações, corresponde à construção de uma cultura de respeito e colaboração.
- Autoestima – está ligado ao reconhecimento, desempenho e conquista. Para organizações, envolve reputação, qualidade e diferenciação.
- Transformação – trata do crescimento contínuo e da abertura à mudança. No nível organizacional, corresponde à inovação, aprendizado e adaptabilidade.
- Coesão Interna – representa o alinhamento com valores, propósito e visão. Para organizações, é o momento em que missão, visão e valores se tornam guia prático.
- Fazer a Diferença – envolve contribuir para algo maior que si mesmo. Nas organizações, traduz-se em responsabilidade social, ética e compromisso com o impacto positivo.
- Serviço – refere-se à busca por deixar uma marca duradoura no mundo. Para organizações, significa criar um legado coletivo e contribuir para o bem-estar da sociedade e das futuras gerações.
Esse modelo mostra que a evolução pessoal e organizacional estão interconectadas: quanto mais a empresa avança em estágios elevados, mais favorece o desenvolvimento das pessoas, ampliando prosperidade e sustentabilidade. Quando aplicado ao EVP, esse processo permite atender às necessidades das pessoas colaboradoras e, ao mesmo tempo, gerar retorno sobre os investimentos em seus ativos. Em outras palavras, quanto mais a organização fortalece sua proposta de valor e cuidado com seus talentos, maior é o impacto positivo no negócio. Esse retorno vai além da performance, refletindo-se no fortalecimento da cultura como ativo estratégico, capaz de ampliar a atratividade, sustentar produtividade e gerar prosperidade duradoura.
Desenvolvendo os 7 estágios de Barrett pelo EVP e Employee Experience rumo à prosperidade organizacional
EX-Jornada da Pessoa Colaboradora

O Employee Experience (experiência da pessoa colaboradora), segundo Jacob Morgan (2017, p. 8, tradução nossa), representa o desenho intencional das experiências que os colaboradores vivenciam dentro da organização. O employee experience é, então, “o resultado da interseção entre as expectativas, necessidades e desejos dos empregados e o design organizacional dessas mesmas expectativas, necessidades e desejos”. Ou, em termos mais acessíveis, significa criar organizações onde as pessoas realmente querem estar, e não apenas onde precisam estar.
A cultura organizacional desempenha, portanto, um papel central na construção da experiência do colaborador (EX), embora não se confunda com ela. O EX é moldado por três ambientes — físico, tecnológico e cultural —, sendo este último o de maior impacto, devido à sua maior percentagem de contribuição para a jornada das pessoas nas empresas (MORGAN, 2017). Essa constatação evidencia que, ainda que espaços de trabalho modernos e tecnologias de ponta sejam importantes, é a cultura que determina a qualidade e a continuidade das experiências do trabalhador, influenciando seus efeitos imediatos e de longo prazo. Nesse sentido, o EVP é o conteúdo da promessa e o EX é o meio pelo qual essa promessa se torna realidade. Ambos, quando articulados de forma coerente, sustentam o desenvolvimento das pessoas ao longo dos sete estágios descritos por Barrett, fortalecendo a Cultura Organizacional (Cultural Health) e garantindo prosperidade sustentável.
A construção de um negócio sustentável dentro das organizações exige mais do que metas bem definidas ou sistemas de avaliação de resultados. Trata-se de garantir que, ao longo de toda a jornada do funcionário, suas necessidades humanas estejam contempladas, criando um ambiente capaz de sustentar altos níveis de energia, engajamento e produtividade a longo prazo. Nesse sentido, o modelo dos estágios de desenvolvimento de Richard Barrett, associado ao Employee Value Proposition (EVP), tal como apresentamos neste artigo, oferece um caminho estratégico para compreender como alinhar cultura, práticas organizacionais e gestão de pessoas à prosperidade do negócio.
Esse modelo associativo pode ser compreendido pela Tabela 1.1, com exemplos de ações nas principais etapas da jornada:

Considerações finais
Neste artigo, evidenciamos como os sete estágios de desenvolvimento de Barrett podem ser traduzidos em práticas concretas ao longo da jornada do colaborador, tendo o EVP como fio condutor. Mostramos que a proposta de valor precisa acompanhar a evolução das necessidades humanas e organizacionais, desde aspectos básicos, como segurança e estabilidade, até dimensões mais elevadas, como impacto social e legado. Ao relacionar cada estágio a momentos-chave da jornada — atração, onboarding, desenvolvimento, permanência/ retenção e desligamento —, fica claro que o EVP não pode ser uma promessa restrita ao momento da contratação, mas deve ser vivido de forma consistente em todas as etapas, garantindo coerência entre discurso e prática.
Destacamos ainda como diferentes níveis de consciência organizacional se refletem em distintas formas de cuidar da experiência das pessoas. Nos estágios iniciais, a ênfase está em condições básicas, vínculos de pertencimento e reconhecimento justo; nos níveis intermediários, ganha força a necessidade de aprendizado, autonomia, propósito e alinhamento de valores; e, nos estágios mais elevados, o foco se amplia para impacto social, ESG e legado. Dessa forma, o EVP deixa de ser apenas uma peça de comunicação da marca empregadora e se torna um sistema vivo, capaz de fortalecer a saúde cultural, reduzir a entropia e promover prosperidade organizacional ao integrar necessidades individuais, coletivas e da sociedade.
Para líderes e, sobretudo, para a alta gestão de RH, o desafio que se coloca não é mais apenas entregar processos eficientes ou responder a demandas pontuais de recrutamento, desempenho ou remuneração. O verdadeiro desafio é romper com a lógica das “caixinhas” e assumir uma visão sistêmica, em que EVP, Employee Experience, estágios de desenvolvimento e saúde cultural não são temas isolados, mas dimensões que se entrelaçam e sustentam a prosperidade organizacional e ações de gestão de talentos nas empresas. Nesse sentido, é relevante que o RH se pergunte:
- Nossas práticas ainda estão organizadas em subsistemas isolados, respondendo apenas a demandas imediatas?
- Estamos medindo nossa eficiência operacional, ou seguimos atuando sem visibilidade sobre o quanto desperdiçamos energia em disfunções e desalinhamentos?
- Conseguindo medir a coerência entre o que prometemos na nossa proposta de valor (EVP) e a experiência real dos colaboradores, por meio de métricas como saúde e entropia cultural?
- Nossas práticas de employee experience refletem os valores que declaramos como centrais ou ainda operam de forma fragmentada e contraditória?
Para a alta liderança, fica ainda as reflexões:
- Em que nível de desenvolvimento de consciência organizacional a nossa empresa se encontra e deseja estar hoje?
- Onde queremos chegar em termos de desenvolvimento e valores, para alcançar outros patamares de prosperidade e de contribuição à sociedade?
- As decisões estratégicas da liderança refletem apenas preocupações de curto prazo, ou estão ancoradas em valores de longo prazo, capazes de equilibrar o foco nas pessoas e o foco no cliente?
- Estamos preparados para abandonar modelos tradicionais e fragmentados de gestão e assumir uma visão sistêmica e holística, sabendo que cada decisão sobre pessoas e processos impacta o todo?
Essa mudança exige coragem para rever modelos mentais, abandonar práticas que não respondem mais à complexidade atual e adotar uma abordagem que alinhe cultura, estratégia e valores a cada decisão. Se a prosperidade organizacional depende do equilíbrio entre foco nas pessoas e foco no cliente, cabe à liderança garantir que esse equilíbrio não seja apenas um ideal teórico, mas uma realidade vivida diariamente. Afinal, não existe negócio sustentável sem pessoas engajadas, e não há futuro próspero sem valores e práticas coerentes que sustentem essa jornada.
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¹O Employee Value Proposition (EVP) representa a proposta de valor que a organização oferece a seus colaboradores e pessoas candidatas, englobando benefícios tangíveis (como remuneração e condições de trabalho) e intangíveis (como cultura, propósito e desenvolvimento). O EVP funciona como a promessa da marca empregadora: aquilo que a empresa declara entregar em troca da contribuição de seus profissionais. Sua efetividade depende não apenas da clareza da comunicação, mas, sobretudo, da sua aplicabilidade prática no cotidiano da organização, demonstrando coerência entre discurso e experiência real.
²O Índice de Entropia Cultural mede o nível de disfunção organizacional movida pelo medo. Ele mede a proporção de valores potencialmente limitantes em uma organização” (BARRETT, 2017b, p. xviii, Foreword, tradução nossa).
Referências
- BARRETT, Richard. A Organização Dirigida por Valores: Liberando o Potencial Humano para a Performance e a Lucratividade. 2. ed. Rio de Janeiro: Alta Books Editora, 2017a.
- BARRETT, Richard. The Metrics of Human Consciousness. Lulu Press, Inc., 2015.
- BARRETT, Richard. The Values-Driven Organization: Cultural Health and Employee Well-Being as a Pathway to Sustainable Performance. 2. ed. NY: Routledge, 2017b.
- BUCKINGHAM, Marcus; GOODALL, Ashley. Nove mitos sobre o trabalho: uma nova maneira de pensar cultura empresarial e liderança para promover o potencial criativo e a realização profissional das equipes. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
- GALLUP. State of the Global Workplace: 2025 Report. Washington, DC: Gallup, Inc., 2025. Disponível em: https://www.gallup.com/workplace/229424/employee-engagement.aspx?utm_source=SOGW_2025&utm_medium=PDF_Report&utm_campaign=SOGW_EE_TextLink_2025. Acesso em: 5 set. 2025
- MORGAN, Jacob. The Employee Experience Advantage: How to Win the War for Talent by Giving Employees the Workspaces They Want, the Tools They Need, and a Culture They Can Celebrate. Hoboken: John Wiley & Sons, 2017.
- RIVETTI, Renata. O poder do bem-estar: um guia para redesenhar o futuro do trabalho. 1. ed. São Paulo: Objetiva, ago. 2025.
- SCHEIN, Edgar H. Organizational Culture and Leadership. San Francisco: Jossey-Bass, 1992.
- TAYLOR, Carolyn. Walking the Talk: building a culture for success. London: Random House Business Books, 2015.
- WELLBEING RESEARCH CENTRE. Happiest companies better in multiple measures of firm performance. Oxford: University of Oxford, 2023. Disponível em: https://wellbeing.hmc.ox.ac.uk/news/stock-market-performance/. Acesso em: 5 set. 2025





