Comunicação 360: O poder agora é de quem também escuta 

  A comunicação interna, como a conhecíamos, acabou. Isso não é exagero. Hoje, 73% das informações corporativas chegam ao público externo pelas redes sociais dos próprios colaboradores antes mesmo de qualquer anúncio oficial (Dialog/2024). O que antes seria chamado de vazamento, agora é o novo normal. A era do comando de cima para baixo deu lugar a um ambiente em que cada pessoa é um canal ativo de comunicação e cada mensagem trocada é uma ponte na narrativa viva da marca. Ninguém controla o que transita pelo Whatsapp, por exemplo, mas é possível influenciar ou inspirar o que flui a partir do meio ambiente interno de maneira positiva.  

    Nesse novo contexto, comunicar não é apenas falar, é também saber ouvir. A comunicação 360 graus, conceito que propõe uma integração total entre todos os pontos de vista dentro da organização, em diferentes níveis de hierarquia, funções, habilidades e objetivos, depende tanto da clareza de quem transmite quanto da escuta genuína de quem recebe.  As empresas que não aprendem a equilibrar esses dois movimentos correm o risco de perder conexão e relevância. Se as pessoas não se sentem ouvidas ou não entendem o que é dito passam a dar atenção a outros interlocutores de fora da empresa. Elas se desconectam. Quando isso acontece, o vínculo com o propósito do líder e da organização se rompe e o engajamento desaparece. Na mesma frequência, tudo aquilo que a empresa se propõe a fazer, vender, produzir ou servir, também acaba sendo prejudicado.   

      Mais do que alinhar discursos, a comunicação 360 é sobre criar uma cultura de diálogo, onde o que se pensa, se fala e se ouve caminham juntos. Como alertava Peter Drucker, economista austríaco que é considerado o pai da administração moderna, 70% dos problemas de gestão nascem da má comunicação. Hoje, esse erro custa caro, em reputação, engajamento e talento. 

     A boa comunicação é, por natureza, desconfortável. Brené Brown, pesquisadora americana que ficou mundialmente conhecida após sua palestra no TED em 2010, assistida por mais de 45 milhões de pessoas, e referência nos temas de coragem, vulnerabilidade, empatia e liderança, ensina que comunicar-se bem exige coragem para dizer o que precisa ser dito e maturidade para ouvir o que precisa ser ouvido. Líderes que evitam conversas difíceis em nome da harmonia apenas alimentam o medo e o desalinhamento. A força do líder moderno está em abrir espaço para que verdades sejam ditas e também acolhidas. Simon Sinek, escritor americano (nascido na Inglaterra) e autor do best-seller “Comece pelo porquê”, reforça que liderar é ir primeiro, assumir o risco e criar segurança para que os outros também possam falar. Escutar, nesse contexto, é um ato de poder e reciprocidade. 

      A forma como falamos também importa tanto quanto o que dizemos. Marshall McLuhan, teórico canadense da comunicação e autor da célebre frase “o meio é a mensagem”, previu isso há décadas. Empresas que ainda confiam apenas em e-mails corporativos ou murais digitais estão falando sozinhas. A Geração Z, formada por jovens nascidos entre meados dos anos 1990 e 2010, que cresceram conectados e têm nas redes sociais seu principal canal de expressão, compartilha experiências de trabalho semanalmente. Eles não são plateia, são narradores. Empresas como HubSpot, plataforma americana de CRM e marketing digital reconhecida por sua cultura de transparência, e Patagonia, marca de roupas outdoor símbolo de ativismo ambiental e autenticidade corporativa, já entenderam isso. Optaram por radicalizar a transparência e transformar colaboradores em co-autores da própria reputação. Tiveram ótimos resultados.  

    O protagonismo dos colaboradores é, hoje, o motor da comunicação corporativa. Quando a maioria compartilha suas experiências de trabalho nas redes, a mensagem institucional perde o monopólio da narrativa. E isso é uma oportunidade, não uma ameaça. A HubSpot, atingiu um nível de engajamento interno, mais que o dobro da média de mercado, justamente porque abriu o jogo. A Patagonia conseguiu reter mais colaboradores por incentivar autenticidade. Quando há confiança, o engajamento vem por consequência. 

      O desafio é que muitas empresas ainda comunicam na direção errada. As mensagens internas ainda giram em torno de slogans, valores e programas institucionais. Fala-se muito sobre propósito, mas pouco sobre procedimentos. É um descompasso entre o discurso e a necessidade. Inspiração só funciona quando vem acompanhada de utilidade.  

     A verdadeira comunicação 360 não pertence ao marketing nem ao RH. É uma competência organizacional compartilhada. Nasce do diálogo, da escuta e da clareza. O líder deixa de ser porta-voz para se tornar facilitador de conversas significativas. Simon Sinek, novamente, ensina que as pessoas não compram o que você faz, mas o porquê você faz. E esse “porquê” só é real quando é vivido, e comunicado, por todos. As empresas que compreenderem isso primeiro, não apenas comunicarão melhor, mas se tornarão mais humanas, mais coesas e mais preparadas para o futuro. Afinal, o futuro da comunicação não pertence a quem fala mais alto, mas a quem fala com verdade e escuta de verdade. 


Leia este e outros artigos na 38ª edição da Revista Conteúdo Compartilhado.

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