Em um cenário onde as relações se baseiam principalmente em um mundo virtual, tanto no que tange a busca por conhecimento como nos processos de colaboração e relações humanas, a sociedade está utilizando mecanismos de busca para adaptar-se nesse novo universo de interesses. Assim, devemos cada vez mais selecionar e tentar atribuir significação àquilo que identificamos como interessante para os nossos interesses.
Se refletirmos sobre o comportamento dos algoritmos do buscador Google e nas redes sociais Facebook e Instagram com certeza perceberemos que há algo de “estranho”. Esse estranhamento está baseado no que aparece de retorno das nossas consultas e em nossas linhas do tempo, ou seja, cada vez mais os algoritmos estão trazendo o conteúdo que mais se aproxima do que “queremos”. Esses mecanismos receberam um título de The Filter Bubble, ou traduzindo para o português, não literalmente, o Filtro Invisível. Esse conceito foi originado no TED por Eli Pariser.
O TED (acrônimo de Technology, Entretainment, Design; em português: Tecnologia, Entretenimento, Design) traz uma série de conferências realizadas na Europa, na Ásia e nas Américas destinadas à disseminação de ideias. Suas apresentações são limitadas a dezesseis minutos, e os vídeos são divulgados na internet. Eli Pariser trouxe uma reflexão a respeito da forma que os algoritmos criados pelos buscadores e redes sociais retornam registros. Para ele, o processo de personalizar o indivíduo, gerado por esses mecanismos de busca faz com que as pessoas não tenham ciência do que não está retornado, e sim, acredita que tudo que está visível é o que existe.
Atualmente, quando queremos realizar uma consulta na internet, provavelmente iremos utilizar o buscador Google, pois ele consegue a partir de palavras-chaves buscar conteúdos em páginas da internet e retorná-las para que possamos selecionar qual queremos visualizar. E quando o Google consegue trazer o conteúdo na qual estávamos buscando em primeiro lugar, temos a ciência que estamos com sorte ou que o buscador já está entendendo o que estamos pensando e o que queremos encontrar. Como isso é possível? Para Vise e Malseed (2007), a busca por informação imediata sobre toda e qualquer coisa é associada através de um computador ou de um telefone celular, em que homens, mulheres e crianças passaram a confiar tanto no Google que hoje não conseguem imaginar como era o mundo antes dele.
E quando acessamos uma rede social, como por exemplo o Facebook ou o Instagram, podemos navegar entre as postagens das pessoas na qual estão conectadas a nós, utilizando uma relação digital denominado como “amigo”. Isto parece bem interessante, pois o sentimento de estarmos sendo conectados e tudo que está postado lá é o que está acontecendo neste exato minuto, trazendo um sentimento de que tudo é em tempo real, ou melhor, online. E será que isso é verdade? Todos os nossos amigos que possuímos na rede social que postam conteúdos aparecerem na nossa linha do tempo? Realmente é muito interessante, pois tenho mais de 4 mil amigos e minha linha do tempo tem sempre postagens em média de 100 a 200 amigos. Será que os demais amigos não postam nada? Não, se buscarmos pelo buscador da rede social um amigo que não está na nossa linha do tempo, veremos que ele tem postagens. Então, como isso é possível? De acordo com Pariser (2012), o Facebook verifica quais publicações são clicadas mais vezes, e oculta as publicações de pessoas nas quais você menos visualiza e clica.
Podemos entender que esses comportamentos, que são oriundos dos algoritmos, querem que tenhamos o sentimento de ver o que queremos mais visualizar, mas basta selecionarmos um outro “amigo” ou enviarmos uma mensagem para esse outro “amigo” que logo o Facebook entende que queremos ter uma relação mais próxima com ele, assim, ele começará a aparecer mais vezes na nossa linha do tempo.
Em “O Filtro Invisível”, Pariser (2012) mostra que não temos tanta autonomia quanto pensamos em nossas navegações pela internet. O autor destaca que os filtros criados pelas empresas impedem que se tenha acesso ao conteúdo total da rede digital, mostrando apenas aquilo que elas acham que desejamos que seja exibido. Para corroborar com isso, Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, descreve que: “[…] a morte de um esquilo, na frente de sua casa, pode ser mais importante para você do que pessoas morrendo na África.” (PARISER, 2012, p.7).
Para corroborar com isso, a Revista Time classificou a Google como a empresa mais inteligente do ano de 2006, e os fundadores Larry Page e Sergey Brin receberam o título de “Thomas Edisons da Internet” (OCAÑA, 2013). Os buscadores mudaram a forma como a internet funciona hoje, segundo Pariser, Sheryl Sandberg (diretora de operações do Facebook) e Tapan Bhat (vice-presidente do Yahoo), “o futuro da internet é a personalização”. A partir de agora a rede irá girar em torno do “eu”, criando uma forma de entrelaçar a rede de forma inteligente e personalizada para o usuário. Eric Schmidt, presidente da Google, identifica que o produto que eles querem projetar tem como objetivo adivinhar o que iremos escrever, e após isso, o Google irá dizer o que deverá ser feito em um único conteúdo retornado (PARISER, 2012).
O buscador Google e as redes sociais Facebook e Instagram baseiam-se nessa enorme quantidade de dados pessoais que foram compilados, que segundo Ocaña (2013), a fonte de riqueza, dentro do âmbito empresarial, está nas informações indexadas e organizadas em uma mudança de paradigma, “da internet das páginas à internet das pessoas”. Na briga pela informação, temos uma visão em que o Facebook está pela primeira vez na frente do Google, pois tem por meio de seus cliques saber identificar por exemplo tipos de filmes ou produtos que preferimos, ou seja, ele conhece melhor os usuários (OCAÑA, 2013).
Por fim, deixo como uma reflexão mais profunda para quem trabalha nas áreas de tecnologia comercial ou negócios, que sempre tivemos a ideia de que a tecnologia ia nos dar mais liberdade e controle sobre o mundo, com mecanismos e equipamentos que permitissem focar nossa atenção apenas no que nos interessa de modo que não necessitemos nos dar trabalho. No entanto a ironia apresenta-se agora, nos dando a liberdade de nos fornecer um controle remoto cheio de botões que nos impeça de fazer algo básico como, por exemplo, trocar de canal, e para piorar, esse controle remoto controla nossas vidas.
Referências:
OCANÃ, Alejandro Suárez. A verdade por trás do Google. Trad. Sandra Martha Dolinsky. São Paulo, 2013.
PARISER, Eli. O filtro invisível: o que a internet está escondendo de você. Trad. de Diego Alfaro. Rio de Janeiro: Zahar, 2012.
VISE, David A. MALSEED, Mark. Google: a história do negócio de mídia e tecnologia de maior sucesso dos nossos tempos. Editora Rocco, 2007.