O que é de fato a Estratégia?
Planejamento Estratégico é tabu! Muitos pensam que é algo muito erudito ou rebuscado, que são necessários especialistas com “passagem pela NASA” para elaborar um bom Plano Estratégico (PE). Outros acham que ele é apenas um conjunto de “statements” bonitos que serão emoldurados ou encadernados para ficar respectivamente na parede ou na estante do CEO, ou seja, apenas para dar certo status à empresa.
Nada disso.
O Planejamento Estratégico nada mais é do que um esforço, realizado por todos aqueles que podem dar uma contribuição efetiva em termos de pensamento sobre o negócio, a fim de definir ou entender a essência da empresa, quais são suas motivações, metas, desafios e traduzir tudo isso em um conjunto de ações e em um ritual de gestão que permita buscarmos de forma organizada alcançar resultados.
Simplifiquei demais? Pode ser. Mas não é muito diferente disso.
Na prática, antes de começarmos a desenhar um Plano Estratégico é preciso que a empresa conheça sua verdadeira identidade. Isso é o básico: porque existimos (Missão), como queremos ser vistos em um determinado prazo (Visão de Futuro) e quais as crenças das quais não aceitaremos nos desviar (Valores ou Princípios).
A ideia aqui não é detalhar o processo de construção do “plano”, mas apenas reforçar alguns pontos chave do caminho a ser percorrido.
Se eu sei quem sou e onde quero chegar, o exercício de entender o ambiente de negócio no qual estamos inseridos fica mais fácil. E para isso podemos utilizar uma série de ferramentas associadas (SWOT, PESTEL, 7Ss, entre outras) que farão aquela discussão mencionada no segundo parágrafo ser mais efetiva e gerar melhores resultados.
Dessa forma, conseguiremos definir grandes Diretrizes Estratégicas, ou seja, os principais pontos de atenção, preocupação, oportunidades para o negócio. Estas diretrizes deverão, ao final de um processo estruturado, ser traduzidas de duas formas: grandes Metas Estratégicas, mensuráveis e Projetos Estratégicos que nos permitam alcançar estas metas num tempo determinado. Esse conjunto de etapas ou “produtos” é o que traduz aquilo que chamo de “Estrutura do Pensamento Estratégico”: Identidade, Diretrizes, Metas e Projetos Estratégicos, ou seja, a Estratégia em si.
E como eu disse anteriormente, o ponto aqui não é ensinar a fazer um PE, até porque há muitos formatos, formas de construir, de registrar, de desdobrar. Cada autor, profissional e consultor foi construindo seu melhor modelo ao longo de sua vivência. O ponto chave aqui é que a Estratégia só faz sentido se traduzida em coisas mensuráveis, gerenciáveis. Porque ela só ajuda, se ela puder ser “gerida”!
A figura abaixo me acompanha há alguns anos em materiais de comunicação e treinamento, com pequenos ajustes para cada situação. Mas na essência gosto muito dela pois traduz de forma simples na qual a estratégia e sua gestão se encaixam no dia a dia de um negócio.
Para completar este tema, apenas uma palhinha (já que aparece na figura) sobre como traduzir e mensurar a estratégia: Mapa Estratégico e Balanced Scorecard! O modelo criado por Robert Kaplan e David Norton, em que o desempenho da organização não se mede apenas por indicadores financeiros, mas de forma balanceada e com relações de causa e efeito, ainda me parece ser a forma mais efetiva de traduzir e gerenciar a estratégia.
Governança e Estratégia: qual o link?
Por tudo o que foi dito acima é que, há algum tempo, eu não falo mais em Planejamento Estratégico. Prefiro falar em estratégia e gestão, ou estratégia e governança.
E aqui é importante fazermos alguns comentários:
- A Estratégia sempre é responsabilidade da Alta administração da empresa. Não pode ser delegada a algum assessor ou gerente. Pode ser facilitada, conduzida, apoiada por uma equipe montada para tal. Mas é tarefa da Alta Administração. Intransferível! É inclusive, segundo o IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), uma das principais atribuições de um Conselho de Administração.
- Por isso mesmo, a gestão da Estratégia deve ser uma parte chave do Sistema de Governança das empresas. Precisa estar inserida na pauta das principais reuniões e ter uma forma eficaz de ser avaliada, ter sua execução acompanhada, revisada.
Governança, segundo o IBGC1 é o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle, e demais partes interessadas. Esse sistema, usualmente, é composto por um conjunto de estruturas organizadas para viabilizar e organizar o processo decisório da empresa. Um Conselho de Administração ou Consultivo, Comitês de apoio ao Conselho, a Diretoria Executiva, entre outras estruturas.
No entanto ainda hoje se vê empresas que organizam uma estrutura de governança para atender algum requisito ou formalidade, ou para “parecer” que cumprem as boas práticas da Governança Corporativa (GC).
Segundo Sandra Guerra, no livro A caixa-preta da Governança2, a GC do “parece ser”, aquela adotada por obrigação… ou até mesmo de forma oportunista, é incapaz de gerar valor sustentável, mas é capaz até mesmo de destruir o valor. E muito.
Por outro lado, estudos realizados por empresas sérias, como por exemplo a McKinsey& Company3 revelam que o “valuation” de uma empresa aumenta se ela tiver práticas superiores de governança, com investidores afirmando que pagariam prêmios entre 18% e 28% (num estudo do ano 2000) por ações de empresas com tais práticas. Portanto, temos em mãos dois temas muito sérios: Estratégia e Governança. E não se pode brincar com nenhum dos dois.
Resumindo
Empresas com um processo maduro de reflexão estratégica e formulação da estratégia, e que a traduzem em metas e ações mensuráveis que são inseridas num ritual de gestão/governança, além de provavelmente valerem mais, também terão maior probabilidade de sucesso.
Vivi uma situação em uma das empresas em que trabalhei, que pode ser um bom exemplo. Era julho de 2008 e estávamos em uma reunião com líderes globais da empresa, avaliando resultados e recontratando novas metas. Era uma reunião que fazia parte de um ritual maduro de governança, e a Estratégia era a base das metas e projetos apresentados.
Os resultados do momento eram positivos. Mas alguns indicadores estratégicos de processos internos mostravam que mais adiante, se alguma condição externa ao negócio mudasse, nós poderíamos ter problemas. O CEO percebeu isso e convocou todos a iniciarem alguns planos de ação imediatos. Dois meses depois, em setembro, o Lehman Brothers quebrou e teve início uma crise global importante. Todos se lembram.
Em função das ações que já estavam em andamento, pudemos enfrentar a crise de maneira mais estruturada, e com menos sobressaltos.
Isso nos remete ao momento atual e à pandemia do Coronavírus.
É muito cedo para sabermos as consequências desta crise sem precedentes. Sabemos que afetará a economia global. Há quem aposte que o mundo vai mudar. Relações comerciais mudarão, hábitos de consumo, restrições, exigências etc.
Muitos de nossos negócios precisarão se reinventar para sobreviver. Alguns farão isso tão bem que ganharão mercado, criarão mercados!
Meu palpite é que, aqueles que começarem a desenhar logo a sua estratégia para esse novo mundo e a acompanharem de forma assertiva, terão mais chance de sucesso nesse ambiente ainda desconhecido!